domingo, 17 de maio de 2009

ÉRAMOS JOVENS...


ENQUANTO ISSO, EM LIVERPOOL...


Enquanto, no Brasil, o “Exército do Surf” invadia as paradas de sucesso, descendo a Rua Augusta a 120 por hora e transformando tudo numa grande festa de arromba, um grupo de rapazes de Liverpool, interior da Inglaterra, estourava nas paradas do mundo inteiro, com canções românticas – e repetindo com exaustão o refrão: yeah, yeah, yeah !


Ao som alucinante desses embalos, arrastavam atrás de si, milhões de jovens, mundo afora, completamente ensandecidos com os requebros, gorjeios e maneiras de John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Star. Eram os Beatles transformando a cabeça e a história de uma geração !


UM PAÍS DE JOVENS:


O ano de 1966 não foi um ano qualquer. Foi o momento de explosão de Roberto Carlos e sua turma, firmando-se como os comandantes do maior movimento musical de massa do Brasil. Era impossível negar a “loucura” que a presença dos artistas do iê-iê-iê causava, pelo Brasil afora, e tudo isso começou a chamar a atenção dos políticos, da Igreja e, claro, da Polícia !


O delírio provocado na juventude brasileira, durante a explosão da Jovem Guarda, em 1965, radicalizou de vez em 1966, criando uma nova Era na música popular brasileira. Para consagrar ainda mais aquela onda de rebeldia juvenil que vinha sacudindo o mundo, e caíra, feito bomba no Brasil, aqueles quatro garotos de Liverpool declaravam ao mundo, em alto em bom som, no dia 04 de março, em Londres: “Somos mais populares que Jesus Cristo”.


Na época, o Brasil era um país de jovens, onde 53% da população tinha menos de 20 anos. Enquanto os Beatles faziam sucesso lá fora (e aqui dentro também !), o furacão iê-iê-iê continuava assolando o país. Excitadas pelo som das guitarras, pelas letras romântico-rebeldes e pela pose de “galã desamparado” dos cantores, garotas, outrora tranqüilas, passaram a incorporar entidades nada angelicais, dispostas a tudo para provar o quanto amavam seus ídolos, transformando-se num exército selvagem de macacas de auditório, sempre alertas e prontas para dar o bote. Muitas colecionavam pedaços da roupa de Roberto Carlos, fios de cabelo de Ronnie Von, beijos de Jerry Adriani, botões do paletó de Wanderley Cardoso, anéis de Erasmo Carlos, e se encarregavam de montar seu museu particular, transformando bugigangas em raridades.


Mas a vida dos Reis do iê-iê-iê não era nenhum “mar de rosas”, nos idos de 1966. Enquanto Roberto Carlos tentava fugir do ataque histérico das fãs, Ronnie Von recebia telefonemas anônimos e ameaças de seqüestro. Ao mesmo tempo, Jerry Adriani, Eduardo Araújo e o Tremendão Erasmo eram acusados de corrupção de menores. Qualquer motivo era um motivo para a Polícia entrar em cena e pegar carona no calhambeque de sucessos da Jovem Guarda. E não vinha sozinha ! Junto com ela, vinha a Igreja correndo atrás do prejuízo, afinal, essa alucinação coletiva causara um êxodo considerável em seu rebanho , que passou a desejar um “reino dos céus” mais imediato e menos punitivo, e partir para a construção de seu próprio paraíso.


Sem muita opção, setores progressistas do Clero resolveram investir no iê-iê-iê, na tentativa de trazer de volta aos cultos, aquela legião de ovelhas desgarradas. Considerada como heresia por alguns, e uma boa estratégia por muitos, realizou-se um Ato Litúrgico na Igreja Nossa Senhora da Paz, em Ipanema, onde a parte musical da missa seria no ritmo dos Beatles, acompanhadas de citações do Papa, para passar mensagens evangélicas aos presentes. O conjunto escolhido foi “Brazilian Beatles”. A Igreja ficou lotada e, a juventude, empolgada com o desempenho da banda, esqueceu que estava diante de um altar, e surpreendeu, comportando-se como se estivesse em um show qualquer. Embalados pelo ritmo, subiram nos bancos, dançaram, gritaram e transformaram aquilo em uma grande festa de arromba. O sermão foi um mero detalhe e, se alguém ouviu, não prestou atenção. Diante do escândalo, a cerimônia foi suspensa e o plano do Clero “entrou pelo cano”.


Mas se até a Igreja reconheceu o poder da Jovem Guarda, o que restava ao setor político ? Foi, então, que um nobre vereador começou a coletar assinaturas entre seus ilustres colegas e, em agosto de 1966, Roberto Carlos recebia o título de Cidadão Paulistano, sob o delírio das fãs e desespero das autoridades que viram a Câmara Municipal se transformar num verdadeiro caos.


E foi assim aquele excitante ano de 1966: a Igreja caiu no Rock, os políticos rezavam para que Roberto Carlos se candidatasse a deputado, a Polícia não deu folga à turma do Calhambeque e as fãs continuaram alucinadas ! Era a “Juventude Transviada” fazendo da Beatlemania e da Jovem Guarda, a história e a marca de uma geração, onde todos ainda éramos jovens !


Fontes:

Almanaque da Jovem Guarda - Edição Especial CARAS - Outubro, 1996

Revista Marcante / Música - Roberto Carlos e a Jovem Guarda

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